Curitiba contra a compaixão: A campanha que ignora a realidade da vida nas ruas
Em Curitiba, a Prefeitura decidiu lançar uma campanha que desestimula a doação de esmolas. A justificativa? Que a ajuda deve ser canalizada para instituições oficiais, como a Fundação de Ação Social (FAS) e o Banco de Alimentos. A proposta, apoiada por entidades empresariais, soa como uma tentativa de higienizar a cidade — não no sentido de torná-la mais justa, mas de torná-la mais palatável aos olhos de quem prefere não ver a miséria.
É preciso dizer com todas as letras: essa campanha é insensível, equivocada e profundamente desumana.
A fome é urgente. Ela não espera a burocracia institucional, nem se submete ao calendário de políticas públicas que, muitas vezes, falham em chegar onde mais se precisa. Quando alguém estende a mão a uma pessoa em situação de rua, não está perpetuando um problema — está respondendo a uma necessidade imediata com aquilo que há de mais nobre no ser humano: a solidariedade.
Ignorar esse gesto é ignorar a bondade que pulsa no coração das pessoas. É deslegitimar o impulso genuíno de ajudar, de enxergar o outro como alguém digno de atenção, cuidado e respeito. Ao desestimular a esmola, a Prefeitura não apenas falha em oferecer alternativas eficazes — ela tenta apagar a compaixão da equação social.
A cidade tem cerca de 7 mil pessoas em situação de rua. O programa Mesa Solidária serve cerca de 800 refeições por dia. Os restaurantes populares, embora importantes, cobram R$ 3 por refeição — um valor que, para quem não tem nada, é inalcançável. A conta não fecha. E a fome, como bem disse o Sopão Curitiba, não espera.
Morador de rua em Curitiba.
Mais grave ainda é o histórico da cidade, que há décadas flerta com políticas de exclusão. Placas contra esmolas, projetos de lei que multam quem distribui marmitas, campanhas que associam pobreza à criminalidade. Tudo isso constrói uma narrativa perigosa: a de que o problema não é a desigualdade, mas a presença visível dos pobres.
A vereadora Camilla Gonda foi certeira ao afirmar que culpabilizar a esmola é esconder o Estado que falha. E falha mesmo — ao não garantir moradia, emprego, saúde e dignidade. Falha ao investir dinheiro público em campanhas que culpam quem ajuda, ao invés de fortalecer quem precisa.
Esta matéria é um apelo. Não à Prefeitura, que parece ter escolhido o caminho da indiferença, mas à população. Que não se deixe convencer por discursos que criminalizam a empatia. Que continue estendendo a mão, oferecendo um prato de comida, um olhar humano, uma palavra de acolhimento. Enquanto a lei permitir, pois do poder municipal espera-se inclusive que a ajuda ao próximo possa ser criminalizada, no futuro.
Porque, no fim das contas, é na bondade cotidiana que reside a verdadeira política pública — aquela que transforma, que inclui, que reconhece o outro como parte de nós.
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